Wednesday, 7 August 2019

Belo Monte forjou o massacre de Altamira: novo presídio nunca entregue era obrigação da Norte Energia

Belo Monte forjou o massacre de Altamira: novo presídio nunca entregue era obrigação da Norte Energia

Na última segunda-feira de julho, em meio ao fogo cruzado de declarações estapafúrdias e ataques à ciência pelo presidente da República, quase ficou em segundo plano o massacre no Centro de Recuperação Regional de Altamira, que deixou 62 mortos e consagrou definitivamente a escalada da violência no município paraense nesta última década.

Um componente negligenciado, ainda que profetizado há décadas, elucida parte importante da origem desta história que vai além de mais um capítulo da briga por hegemonia entre facções criminosas no norte do país, mas é também uma severa consequência do modo como se materializa o desenvolvimento no Brasil profundo. Boa parte do combustível para o motim veio da obra que já está no rol dos grandes atentados à economia e ao patrimônio ambiental, social e cultural do país: a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte.

O anúncio da retomada do projeto Belo Monte “no menor horizonte temporal possível” em 2005, pela então ministra de Minas e Energia, Dilma Rousseff, aqueceu a mobilização que começava a arrefecer no entorno das obras das usinas de Jirau e Santo Antônio, em avançada fase de construção no rio Madeira. Hordas de trabalhadores braçais e pessoas interessadas em prestar serviço desengavetaram as velhas expectativas de mudar de vida no coração do rio Xingu. O Brasil vivenciava uma queda acelerada do desmatamento e controlava como nunca antes os movimentos de ocupação de novos espaços na Amazônia, tornando as grandes obras oportunidades únicas para muitas pessoas sem perspectivas.

Estimativas da prefeitura de Altamira apontam que a população local cresceu na ordem de cerca de 50 mil pessoas entre 2010 e 2012. A expansão corresponde ao período de início das obras, fazendo explodir a demanda por moradia, segurança, educação, saúde, alimentação e toda sorte de serviços públicos. O abrupto aumento populacional e suas inevitáveis consequências são desdobramentos bastante experimentados nos grandes empreendimentos em uma região ainda tão carente de oportunidades.

Não é por acaso que a legislação do licenciamento ambiental obriga empreendedores a se responsabilizar pelas consequências de todos os impactos ambientais e sociais dos seus projetos. Em Belo Monte, a preocupação com questões de segurança pública se materializou em cerca de R$ 125 milhões que deveriam ser investidos em equipamentos, reformas, veículos, câmeras e uma unidade prisional.

Os prognósticos indicavam um aumento repentino da violência na medida em que uma legião de pessoas desamparadas e sem nenhuma ligação com a cidade desembarcaria em uma região com serviços e equipamentos públicos já saturados e poucas oportunidades efetivas de trabalho na obra. Altamira era uma cidade que mal dava conta de seus 100 mil habitantes e ainda tentava absorver a onda de impacto ocasionada pela chegada da Transamazônica na década de 1970, até então o grande vetor de ocupação daquele cantinho esquecido do mundo.

A criminalidade de fato aumentou, tanto pela ausência de oportunidades quanto pelo aumento da demanda no consumo de drogas e pela consolidação da região como um importante polo na rota do tráfico internacional de cocaína. A cidade viu dobrar os índices de roubos, furtos, acidentes de trânsito e episódios de violência doméstica e vivenciou um aumento de 150% no índice de homicídios na última década.

Trator abre covas no cemitério São Sebastião, em Altamira (PA), para enterro de vítimas do massacre no presídio local.

Trator abre covas no cemitério São Sebastião, em Altamira (PA), para enterro de vítimas do massacre no presídio local.

Foto: Danilo Verpa/Folhapress

A reboque, surgiu em Altamira uma facção própria, Comando Classe A, o CCA, que passaria a década seguinte em disputa tribal pelo varejo de drogas na cidade e pelo controle das rotas de tráfico na calha do Amazonas e na Transamazônica. A CCA é a facção que comandou o motim ocorrido no último mês. Em entrevista ao UOL, Aiala Colares, pesquisador da UEPA, afirma que a dinâmica da organização do crime de Altamira se reconfigurou completamente após o início das obras, de uma pulverização de gangues para um comando central, exercido pelo CCA. “Altamira não cresceu, inchou”, como disse em entrevista contundente o bispo emérito do Xingu, Dom Erwin Kräutler.

O processo se tornou um manual de como burlar os ritos ambientais.

Meia década antes do massacre, à medida em que o monstro de concreto ganhava corpo no leito do Xingu e as profecias sobre seus efeitos na cidade se cumpriam, as ações para atenuar danos negociadas entre a Norte Energia e os órgãos licenciadores não seguiam o ritmo necessário. Do componente indígena ao saneamento básico, passando pela segurança pública, o consórcio de empreiteiras se especializou em empurrar o licenciamento com a barriga, postergando, contestando e simplesmente não executando boa parte do que estava acordado. O processo se tornou um manual de como burlar os ritos ambientais.

Embora tais ações fossem condicionantes das licenças prévias, de instalação e de operação, o governo federal, em cumplicidade, trocou sucessivamente os servidores responsáveis no Ibama e chegou a emitir uma licença parcial que inexiste nos ritos do licenciamento apenas para não prejudicar o cronograma do empreendedor. Essa história eu já contei em detalhes aqui no Intercept.

A judicialização da obra também não tinha efeito devido a um instrumento processual chamado ‘suspensão de segurança’, herdado da ditadura. Embasado por fundamentação política e altamente subjetiva (garantir ordem, saúde, segurança e economia públicas), o instrumento era provocado pelo próprio governo e levou à suspensão monocrática de inúmeras decisões contrárias à Norte Energia.

Altamira já havia alcançado o posto de cidade mais violenta do Brasil quando Dilma Rousseff foi à região inaugurar a usina com este discurso, em maio de 2016.

“Eu tenho imenso orgulho das escolhas que eu fiz. Uma delas que eu quero destacar mais uma vez é a construção da hidrelétrica de Belo Monte como um legado da população brasileira, como um legado para o povo aqui dessa região do Pará. O povo aqui de Altamira, o povo aqui de Xingu, enfim, o povo de toda a região”.

Pouco meses depois, o Profissão Repórter registrava o promotor Antônio Dias cobrando o empreendedor pela entrega do novo Complexo Penitenciário de Vitória do Xingu, com previsão de 306 vagas para homens e 200 para mulheres e que desafogaria o sistema prisional de Altamira: “Nosso complexo atual já está naquela situação de fuga”. Uma resposta sem convicção garantia a entrega em dois meses, por volta de setembro de 2016, quando a massiva força de trabalho já estaria desmobilizada e 20 mil homens sem emprego poderiam engrossar as fileiras das facções na cidade.

Com a obra inaugurada pela própria presidenta e a última licença concedida, entretanto, a urgência acabou. Dezenas de condicionantes ainda estavam pendentes e R$ 60 milhões já haviam sido aplicados em multas quando a Norte Energia recebeu sua licença de operação. Vários deles, incluindo a entrega da unidade penitenciária, jamais foram cumpridos.

Belo Monte é componente preponderante na formação do barril de pólvora que explodiu no final de julho.

Não é novidade que as cidades médias amazônicas são terreno fértil para a mais variada gama de atividades ilícitas, tanto pela exuberância de recursos próximos quanto pela presença de alguma infraestrutura com precária governança. Em Altamira, todos esses aspectos foram turbinados com um empreendimento inviável e dispensável, tocado às pressas e à revelia das melhores práticas de gerenciamento de impactos. Por induzir a ocupação desordenada e falhar em reduzir os impactos que impôs, Belo Monte contribuiu – e muito – com a formação do barril de pólvora que explodiu no final de julho..

A Norte Energia correu para soltar duas notas oficiais nos dias seguintes ao massacre, refutando a relação entre a não entrega do presídio com um massacre de “causas complexas e conjunturais”. Prometeu a entrega do presídio em dois meses, quatro anos após a licença definitiva, assunto que será investigado pelo Ministério Público Federal.

Um arroubo de transparência veio de José de Anchieta, diretor socioambiental da Norte Energia, em 2016, durante uma entrevista no Profissão Repórter. A repórter pergunta: “Se todos os impactos de Belo Monte fossem mitigados e compensados com responsabilidade do consórcio, Belo Monte seria financeiramente viável?” Em bom português: considerando-se que ribeirinhos, indígenas, jovens, vítimas da violência, os idosos que não se sentam mais à porta de casa para conversar – nenhum deles queria a usina –, Belo Monte não deveria arcar com os custos do prejuízo difuso que desencadeou?

A resposta é de um cinismo voraz: “Belo Monte deixaria de ser usina, passaria a ser ‘Ministério da Humanidade’”, disse Anchieta. Estima-se que Belo Monte tenha custado quase R$ 40 bilhões de reais.

Operários trabalham na construção da casa de força principal da hidrelétrica de Belo Monte no rio Xingu em Altamira (PA).

Operários trabalham na construção da casa de força principal da hidrelétrica de Belo Monte no rio Xingu em Altamira, Pará.

Foto: Lalo de Almeida/Folhapress

Licenciamento na berlinda

Mais pressa, menos rigor, menos responsabilidades para empreendedores. O caminho que alguns parlamentares encontraram para “destravar a economia” já foi experimentado em Mariana, em Brumadinho e em Altamira.

Nas próximas semanas, a Câmara dos Deputados volta a debater o arcabouço regulatório do licenciamento ambiental no Brasil, quando a atribuição da responsabilidade pelos impactos deverá ser alterada. Os principais alvos do relator, o deputado do Democratas paulista Kim Kataguiri, assessorado por entidades como a CNA e setores da indústria, parecem ser os depauperados órgãos ambientais e indigenistas, frequentemente acusados de atrasar o progresso do país com exigências de condicionantes supostamente ideológicas.

São conhecidos os problemas estruturais dos ritos do licenciamento e das autarquias que atrasam a análise de processos e levam a desastres como os de Belo Monte e Altamira, como a precária qualidade dos estudos ambientais apresentados pelos empreendedores, o desfalcado plantel de servidores e a permeabilidade à ingerência política. Kataguiri parece querer “resolvê-los” com a simples desobrigação de se licenciar e com a redução do papel dos órgãos governamentais envolvidos.

As versões preliminares indicam que será proposta a dispensa de licenciamento a atividades agrícolas e a obras de ampliação e melhorias em projetos de infraestrutura. Também que os precarizados órgãos ambientais tenham um limite de tempo para conceder as licenças, o que implica que a prioridade passa a ser o prazo dos empreendedores e não a redução de impactos e a própria análise de viabilidade dos projetos, que pode nem acontecer. Como cumprir prazos tão apertados quando não se tem equipe, estrutura e estudos de qualidade?

Outra proposta bastante grave divulgada no início de agosto é que os licenciamentos passem a gerenciar apenas os impactos diretos da obra, como o barramento do rio Xingu, ignorando os impactos indiretos, como a explosão da violência em Altamira. O Ministério da Humanidade se tornaria algo mais parecido com uma subsecretaria.

Neste contexto, preocupa com maior urgência o iminente asfaltamento da BR-319, tão sonhado pelo atual governo e alvo recente do populismo do MBL, grupo do qual Kataguiri é fundador. A reforma da rodovia se arrasta há anos devido à afrontosa magnitude dos impactos indiretos que desencadeará simplesmente por abrir uma fissura no meio do último bloco isolado – e por isso quase intacto – de florestas da Amazônia brasileira, entre os rios Madeira e Purus. Povos indígenas isolados e de recente contato, extensas faixas de florestas sem governança e inestimável patrimônio natural e mineral estariam finalmente ao alcance das mais diversas atividades ilícitas. O jovem deputado se prepara para ir a plenário em seu primeiro grande momento de glória, como indutor de mudanças significativas no ordenamento jurídico do país, depois de tanto tempo esbravejando passivamente na internet.

Tais desdobramentos obviamente interessam muita gente poderosa, em Brasília e nos grandes centros do país, que financiam tais atividades e são força muito mais influente no sonho desta obra do que os próprios usuários da rodovia. Com a dispensa de licenciamento ou sem levar em conta os impactos indiretos, seria mais um vetor de ocupação massiva como as que já destruíram o interior do Maranhão, do Pará, de Rondônia e do sul do Amazonas. Com a sensação de liberou geral difundida pelos novos governos locais e federal, provocados pela paralisia dos órgãos ambientais e os seguidos pronunciamentos públicos de incentivo, o céu é o limite para os índices de desmatamento.

Ao mesmo tempo, em algum lugar do Brasil profundo, um homem carente de perspectivas se coloca em marcha para aproveitar o novo boom do garimpo. Outros dez começam a se preparar para as oportunidades que poderão surgir nos próximos anos – invadir um naco de terra em novas fronteiras, garimpar terras intocadas, participar de mais alguma grande obra. Outra centena sente as primeiras inquietudes.

Quinhentos e treze parlamentares começarão a decidir o destino deles.

The post Belo Monte forjou o massacre de Altamira: novo presídio nunca entregue era obrigação da Norte Energia appeared first on The Intercept.

Tuesday, 6 August 2019

Fuga de cérebros e autoexílio: governo Bolsonaro reacende o trauma da ditadura

Fuga de cérebros e autoexílio: governo Bolsonaro reacende o trauma da ditadura

Cátia e Joana são casadas e terminaram doutorado na área das ciências da saúde por volta de 2016. Elas investiram em publicações em revistas científicas internacionais e partiram para os Estados Unidos em janeiro para atuar como pesquisadoras visitantes na Califórnia. Elas não pretendem retornar ao Brasil porque não veem perspectivas de concurso em suas áreas. Mas o fator decisivo da saída do país foi o medo. Uma noite, saindo de mãos dadas de uma festa no Rio de Janeiro, homens dentro de um carro lhes jogaram ovos e gritaram: “seus dias tão contados, sapatonas!”

Cátia e Joana são algumas das muitas colegas que conheci em um recente giro acadêmico no exterior. Em tom de desespero, desesperança e até pânico, diferentes pessoas me contaram que não queriam voltar sob hipótese alguma. Homossexuais sentiam medo de morrer, pesquisadores consideravam não haver mais condições de se fazer ciência no Brasil.

Triste país em que um slogan da ditadura militar volta a fazer sentido: ‘Brasil, ame ou deixe-o’.

Multidões têm optado por deixá-lo. Dando pulos sobre a terra plana e apontando arminha para o próprio pé, há quem comemore. ‘Não estão contentes? Vão embora!’, gritam os bolsonaristas nas redes sociais, ignorando o fato de que emigração em massa é um dos mais alarmantes sinais do fracasso do desenvolvimento de uma nação. O efeito de um país que expulsa sua própria gente é uma bomba-relógio pronta para explodir no colo de Bolsonaro. Mas, infelizmente, é característica do bolsonarismo preferir morrer enforcado com a própria corda do que refletir sobre as consequências de seu governo.

O Brasil hoje exporta gente. Segundo o Ministério das Relações Exteriores, há 3 milhões de imigrantes brasileiros no exterior. Dados da Receita Federal concedidos ao Intercept indicam que a crise econômica tem causado uma debandada do país. Em 2011, em plena fase de crescimento econômico, o número de pessoas que declararam saída definitiva era de 8.170. Em 2014, ano em que começa a crise econômica, 12.451 deixam o país. Já em 2017 e 2018, esse número chega à casa dos 22 mil. Ou seja, em sete anos, o número de emigrantes brasileiros quase triplicou.

Para a pesquisadora Patricia Villen, a emigração deverá se acentuar nos próximos anos em função da crise econômica, mas também da ascensão da extrema direita. Trata-se de um desenraizamento forçado de caráter econômico, mas sobretudo psicológico, que causa um profundo sofrimento. Atualmente, pessoas de todas as classes sociais estão deixando o Brasil em busca de oportunidades lá fora, na mesma medida em que começa a crescer o caso de cidadãos que, como nos tempos da ditadura militar, buscam abrigo no exterior por temerem as consequências de perseguição política e por orientação sexual.

Entre 1964 a 1985, 5 mil brasileiros se exilaram no exterior. Como aponta a pesquisadora Sara Duarte Feijó, o imaginário brasileiro sobre o exílio é construído sobre a ideia de “volta por cima”, fixada na representação do desembarque de exilados no Galeão ao som da canção “O Bêbado e O Equilibrista”. No entanto, pouco sabemos do sofrimento dos expatriados: do seu cotidiano de dificuldades, do sentimento de ser arrancado de suas vidas, das saudades da família. É esse cenário que milhares de brasileiros estão enfrentando ou irão enfrentar no exterior.

Fuga de cérebros aponta o fracasso de um país

Um estudo realizado pela empresa JBJ Partners mostrou que em quatro anos, de 2014 a 2018, o total de pessoas com curso superior ou pós-graduação que migraram do Brasil para os Estados Unidos pulou de 83% a 93%. Esse fenômeno, chamado fuga de cérebros (brain drain, em inglês), significa a emigração significativa de pessoas que levam sua qualificação especializada para outro país mais desenvolvido.

Diversos especialistas em ciência e tecnologia têm alertado publicamente que esse quadro de perda de talentos tende a se tornar mais crítico em virtude tanto do corte de 30% das universidades federais – o qual foi anunciado em tom de deboche pelo ministro da Educação, Abraham Weintraub – quanto do de 42% no MCTIC. São cerca de 80 mil bolsistas do CNPqque correm o risco de não serem pagos a partir de agora.

Ainda que não tenhamos números consolidados de 2019, meu circuito no exterior me deu pistas de que podemos estar diante de um fenômeno sem precedentes. Em cada uma das 30 universidades que passei, conheci de três a cinco doutorandos ou pós-doutorandos que não queriam retornar. Isso significa uma amostra de 90 a 150 pessoas.

O que mais me chamou atenção neste meu giro recente foi não ter encontrado uma pessoa sequer dizendo que queria voltar ao Brasil.

Tenho mantido contato sistemático com acadêmicos brasileiros que atuam fora. Sempre teve pessoas que queriam ficar no exterior por causa das melhores condições de trabalho e infraestrutura, mas esse grupo era contrabalanceado com os outros tantos patriotas que sonhavam retornar ao Brasil para retribuir o que aprenderam lá fora. O que mais me chamou atenção nesse meu giro recente foi não ter encontrado uma pessoa sequer dizendo que queria voltar para o Brasil nas atuais circunstâncias. Os pesquisadores ainda cultivam esse sonho, mas consideram o clima inóspito para cientistas. Eles estão certos.

O Ciência sem Fronteiras do governo Dilma Rousseff é um caso importante a ser discutido. O programa tinha objetivos ambiciosos de alavancar o desenvolvimento científico e tecnológico, e contribuiu significantemente para o crescimento intelectual de 100 mil jovens –muitos deles tiveram sua primeira experiência fora do país. Mas muitos estudantes reclamam de terem sido incentivados a buscar formação fora e de o país não ter condições de recebê-los de volta.

Entre 2016 e 2017, dialoguei bastante com estudantes do CsFem função de minha militância no tema do sofrimento acadêmico. Àquela altura, a situação desses pesquisadores altamente qualificados já era crítica. Hoje é calamitosa e desesperadora, com casos de depressão e tentativas de suicídio.

Há poucos anos, questionava-se se voltar ao país era única forma de retornar para o Brasil o conhecimento adquirido lá fora. Muitos estudantes pediam mais flexibilidade nas políticas de retorno, e a postura do governo era de reforçar a importância da volta como pagamento ao que fora investido neles. Hoje, o quadro é radicalmente diferente. Uma recém-doutora em Sociologia comentou comigo, com sarcasmo e tristeza, que o governo agradece se ela não voltar: “meu conhecimento não tem valor algum no país que me financiou.”

Para quem não tem estabilidade no Brasil, só resta a rota de fuga forçada.

Pesquisadores veem que seus dados não importam. Intelectuais são perseguidos como doutrinadores. Seguindo a lógica fascista, estamos diante de uma inédita estigmatização do conhecimento acadêmico no Brasil que transforma o cientista no inimigo interno a ser destruído. Para quem não tem estabilidade no Brasil – e mesmo para quem tem –, só resta a rota de fuga forçada.

BRAZIL-POLITICS-LULA DA SILVA

Jean Wyllys renunciou ao seu terceiro mandato na Câmara devido a ameaças de morte.

Foto: Mauro Pimentel/AFP/Getty Images

A volta do exílio político

De Chico Mendes a Marielle Franco, ativistas ambientais e políticos sempre foram alvo de perseguição. Mas hoje o medo é generalizado. Acadêmicos, intelectuais e ativistas sentem que estão sob ameaça de vida e terror psicológico. Não custa lembrar as declarações de Bolsonaro quando disse, por exemplo, “vamos fuzilar a petralhada”.

Estamos voltando ao quadro agudo de exílio. Nós teremos um número cada vez maior de pessoas que buscam proteção no exterior. Os casos mais conhecidos são do ex-deputado Jean Wyllys, da antropóloga e professora de Direito Debora Diniz e a da filósofa Márcia Tiburi, que residem no exterior por terem suas vidas ameaçadas por grupos de extrema direita. Bolsonaro, novamente, deu um péssimo exemplo à população, reagindo ao anúncio da partida de Jean com um tuíte “grande dia”.


Além disso, há um contingente imenso de pessoas que sai do país por conta de sua orientação sexual e se autoexilam no exterior. Se o Brasil já era o país que mais assassina pessoas transgênero no mundo, não é mera dedução lógica que esse quadro tende a piorar no governo Bolsonaro. Pesquisa recente, conduzida pelo site Gênero e Número e Fundação Ford, mostrou que mais da metade da comunidade LGBT disse ter sofrido violência física e verbal no período das eleições, confirmando que o discurso de intolerância das eleições teve impactos concretos.

Assim chegamos a uma pergunta importante: como a desigualdade e os privilégios impactam no processo de emigração? Quem são, de fato, as pessoas que conseguem se salvar no exterior? As respostas a gente já sabe.

O problema da emigração em massa não é só da elite, mas de todo o país.

É inegável que quem mais sofrerá com a violência política do Brasil, bem como com a falta de oportunidades, serão os mesmos grupos vulneráveis de sempre. É a menina negra e lésbica na parada de ônibus, é o precariado que terá suas condições de trabalho ainda mais deploráveis com o alto índice de desemprego, o estudante cotista de baixa renda que mais sentirá o impacto do desmonte das universidades.

Essas pessoas não terão capitais econômicos e sociais para migrar. E quando migram estão muito mais expostos tanto à violência xenófoba contra latinos quanto ao sofrimento do desterro. O problema da emigração em massa não é de elite, mas de todo o país. Quando se produz inovação e tecnologia, ganha a nação. Um país que exporta seus melhores cérebros é um país que fracassou.

Tanto uma parte significativa da fuga de cérebros quanto a perseguição política configuram um retorno a um cenário de saída de brasileiros motivado pela migração econômica e autoexílio em face de um medo iminente. Como nos tempos da ditadura militar, não são apenas os exilados que sofrerão o trauma do desterro, mas as próximas gerações também. Enquanto isso, Bolsonaro declara, em seu Twitter, que é um absurdo que o governo tenha gasto R$ 9,9 bilhões em reparação aos perseguidos da ditadura.

Uma antropóloga e ativista brasileira fez uma entrevista de emprego em 2012 para uma universidade no exterior. Na banca, perguntaram-lhe por que ela queria sair do Brasil em plena fase de crescimento econômico. Essa mesma pesquisadora fez outra entrevista lá fora em 2019, e a pergunta foi bem diferente: “Além do cenário político do seu país, existe alguma outra motivação para deixar o Brasil?”

Somos um vexame internacional e estamos chutando nossa própria gente.

 

The post Fuga de cérebros e autoexílio: governo Bolsonaro reacende o trauma da ditadura appeared first on The Intercept.

Monday, 5 August 2019

Lessons From Moscow: How China Might Handle Hong Kong

Large crowds are taking to the streets—outraged by how the place they live is being run, angry that police are beating up protesters—and railing against a broken system they say needs to be made more democratic. The local leader in charge is beholden to a distant capital, and is out of touch with the populace.

A worrying question begins to be asked: Will we see a repeat of what happened in June 1989, when Chinese authorities violently put an end to weeks of overwhelmingly peaceful protests in Tiananmen Square and plazas across the country?

This scenario is relevant to Hong Kong right now, but could also have been written about a place at the other end of Eurasia 30 years ago.

When the protest wave that ultimately led to the fall of the Berlin Wall began, people feared that East Germany’s leaders might take a page from Beijing’s playbook. Riot police stood ready. Masses of people were on the streets in cities such as Leipzig. East German leaders had openly expressed support for how the Chinese Communist Party (CCP) had crushed the Tiananmen upheaval, and the term Chinese solution began to be uttered to describe the use of violence to stop the struggle.

In the end, the East German authorities did not kill protesters. They went another way, in part because Mikhail Gorbachev sent signals that while Moscow had backed repressive moves in Soviet satellite states and allies before—sending troops to East Germany in 1953 and to Hungary in 1956, and allying with other Warsaw Pact armies to crush the Prague Spring in 1968—the situation now was different. The Soviet Union was changing; he was a new kind of leader; and he did not want to be seen as just like his predecessors. Gorbachev even refrained from suggesting, as Leonid Brezhnev did to Poland’s Communists in 1981, that while troops were not en route, Moscow was willing to see local officials get as tough as they wanted to in trying to restore order.

The similarities with Hong Kong are clear, yet no analogy from the past will provide a definitive answer to the question of which path Beijing will take. History does not repeat itself, in part because situations are always changing and current actors are aware of what has happened before. Still, as specialists in the history and politics of Eastern Europe and East Asia, respectively, we think it is useful in this case to look to the old Soviet bloc as well as to China’s own past when grappling with possible developments in Hong Kong.

Carrie Lam, Hong Kong’s chief executive, is in a situation not unlike that of heads of states within the Soviet orbit. Though she assumed her position through nondemocratic means—via an election with limits on who could vote and in which the candidates were carefully vetted by Beijing—Lam claims to represent and be determined to protect the people of Hong Kong. But like previous holders of the position, she is beholden to Beijing in much the way that some Eastern European leaders were to Moscow. Beijing could, as the Soviets did in Poland in 1956 in the face of public unrest, dump its own puppet: force Lam to step down; make cosmetic concessions; find a new leader less tainted by close relations with the CCP; and hope that those changes take the wind out of the protesters’ sails.

These tactics can work—indeed they did, in Poland—but only for a while. The Solidarity trade-union movement emerged in 1980 after a decade of worker unrest and demanded political freedom. Replacing a leader and offering minor compromises have also worked in Hong Kong in the past, as chief executives associated with actions that inspired protests in 2003 and 2014 either eventually stepped down, in the former case, or did not get an expected second five-year term, in the latter one.

The outlines of such a deal seemed in place last month. The Hong Kong government had shelved, for a time at least, the law on extradition to the mainland that had given rise to these latest mass demonstrations, and it could have easily taken the further step protesters were demanding of withdrawing the law completely.

At least so far, though, Beijing has shown no interest in replacing Lam. Some moves made in 2014 have been repeated—the use of tear gas, trying to wait out the protesters—but no additional concessions have been made. One key decision early on that could have helped defuse the situation, other than replacing Lam, would have been to give in to the popular cry for an independent investigation of claims of police brutality. Yet instead of doing this, the authorities have just ramped up their use of repressive methods. There has been a repeat of thugs attacking protesters; sharply more tear gas has been used than in 2014; and police have shot at protesters using rubber bullets.

One scenario that is off the table is a repeat of East Germany in 1989. Xi Jinping, China’s leader, has made it crystal clear throughout his time in power that, perhaps even more so than his predecessors, he sees Gorbachev as a negative role model, someone who lost an empire and then control of the metropole. The CCP has sent signals to Lam that it will back the Hong Kong government and police taking stern measures, though, if possible, not killing anyone.

This call for no fatalities suggests that a second outcome—one that is not desirable in Beijing’s eyes, but that is not impossible—could be a repeat of what the CCP itself did on June 4, 1989. The Chinese military has several thousand troops stationed in Hong Kong, per the terms of the handover of the city from Britain to China in 1997, so the capacity for a violent solution is at hand. But it would not be costless. Although never as sensitive to Western denunciations as the Soviets, who still considered themselves “European,” China did promise Hong Kong its own social system and a “high degree of autonomy” after regaining it from Britain. A military action would not technically be an invasion, but it would look to the world like one, and would render that promise completely meaningless, exposing Beijing’s domination as hard-edged colonial control.

Xi might be willing to pay this price, especially if he senses disorder in Hong Kong threatening to spread to the mainland—but there seems to be little sign of that happening. It is not 1989, when there were major protests not just in Beijing but in scores of Chinese cities. China also has a chip in the international game today in a way it did not 30 years ago: Donald Trump’s administration has reportedly told officials to hold back their criticism over the crackdown in Hong Kong, and may well remain unmoved by military violence, but would surely try to make use of it to sway the ongoing trade war between the United States and China. There are also already calls for a boycott of the 2022 Winter Olympics in Beijing over outrage at the gross violations of human rights in the western Chinese region of Xinjiang, where at least hundreds of thousands and likely well over 1 million people, mostly Muslim, are incarcerated in a large network of camps. If there were images of military violence in Hong Kong to go along with the documented horrors in Xinjiang, boycott calls would be amplified dramatically. The June 4 option is there, but it is not an appealing one.

Perhaps more tempting would be a variant of the Polish solution of 1981: Prompt the Hong Kong authorities to declare martial law, deploy their police forces with greater brutality, arrest the protest ringleaders, grant a new round of cosmetic concessions, and hunker down until the crisis passes. The problem with this solution, in the minds of Beijing’s leaders, is that in Poland, it failed spectacularly. The calm that came after the imposition of martial law merely masked the brewing storm. Solidarity never really left the scene, and the image of a mass democratic social movement only grew in the popular imagination. Some leaders were arrested but many more went underground, and they returned in 1989 to bring down the entire Communist system. Beijing must be keenly aware of the risks of outsourcing repression to its local clients. Still, this case seems particularly relevant, as China has so far emphasized that the Hong Kong authorities should handle this on their own, while giving them the same signal that Brezhnev offered Polish leaders in 1981 about the capital being ready to add direct support in a last resort.

Of course, we need not look only at Soviet-bloc cases. The final years of the Cold War also saw authoritarian leaders dependent on the United States dealing with popular movements in varied ways, and the signals Washington sent were a factor in the course history took. In 1980, for example, the South Korean military carried out a brutal massacre in Gwangju, knowing that Washington would not withdraw support. By contrast, while Washington had signaled to the Philippine dictator Ferdinand Marcos in the 1970s that it saw no problem with his using force to crush opponents, it made clear at the time of the People Power Revolution in the mid-1980s that its attitude had changed.

Historical analogies, however, are never perfect. One big difference between Beijing today and Moscow then is capitalism’s importance across China. The rise of the private sector and an extensive criminal underworld have given Beijing the option, one not available to either Warsaw or Moscow circa 1980, of turning to private thugs armed with sticks and metal bars to intimidate protesters and supportive journalists. The supply of thugs is large, and their use may help limit mass mobilization in the short run. But private thugs cannot be counted upon in the long run, and their use could become a new source of grievance, raising the specter of further deterioration of governmental authority.

The use of gangsters highlights an aspect of the repression story in China that predates the 1980s—indeed, an aspect that predates the Cold War. In 1927, decades before the CCP founded the People’s Republic of China, Chiang Kai-shek’s Nationalists turned against the Communists, with whom they had briefly made common cause. Chiang’s forces used gangsters to help them in a “White Terror” drive to rid the country of all “Reds.” Protesters in Hong Kong have sometimes accused the CCP of following in the footsteps of the Nationalists, who are vilified in official Chinese-government textbooks, claiming that Beijing and its proxies are carrying out a “White Terror” of their own. And like the Nationalists then, the CCP and its allies in Hong Kong have claimed that protesters are in league with a foreign power and sent thugs to attack crowds, a tactic used by Beijing in Hong Kong on a small scale in 2014 and 2015, before being expanded this summer. (Another Nationalist strategy the CCP has used recently in Hong Kong is ginning up “pro-stability” demonstrations and claiming that these anti-protest protests represent the popular will more than the much larger and more spontaneous anti-government events. Chiang’s representatives in Shanghai did the same thing during the years immediately following World War II.)

There are limits to this comparison with the pre-Communist Chinese past, just like there are to those comparisons with various parts of the world in the 1980s. Bringing them up, though, is still relevant. It helps underscore that authoritarian governments rely on a diverse playbook. This makes them a dark mirror image of protesters, who similarly can—and, in the case of Hong Kong activists, definitely do—draw on repertoires of contention that have roots in varied places and times.

Sunday, 4 August 2019

What the Criminalization of Instant Divorce Means for India’s Muslims

In January 2016, Afreen Rehman, a resident of Jaipur, in northwest India, was recovering from a road accident when her husband sent a letter to her maternal uncle and grandfather.

Syed Ashar Ali Warsi had handwritten the word talaq thrice. Their marriage of 16 months was over.

Warsi had used an interpretation of Islamic law that allows a husband to annul a marriage by uttering the word talaq—Arabic for “divorce”—three times. The practice is commonly known as “triple talaq,” or instant divorce.

On Tuesday, India’s Parliament passed a bill to criminalize the practice of instant divorce. A man who imposes an instant divorce on his wife faces up to three years in prison as per the Muslim Women (Protection of Rights on Marriage) Bill of 2019. The bill awaits presidential assent, which it is expected to get.

Women’s-rights activists, Islamic groups, and political parties are divided on the contentious issue. Many Muslim women’s groups have demanded the change, saying that the tradition of instant divorce is detrimental to them. (The custom is banned in more than 20 Muslim countries, including Egypt, the United Arab Emirates, Pakistan, and Bangladesh.) More conservative Islamic organizations say that the government has no business getting involved in what is, in effect, a religious practice. Other activists acknowledge that the change is needed, but say that it comes at a time when Hindu nationalism is the dominant political movement in India and as religious minorities, especially Muslims, are becoming more and more marginalized in the country.

[Read: The meaning of India’s “beef lynchings”]

Instant divorce is far from universal among Indian Muslims. There is no mention of it in the Koran, which says that a couple chooses separation once they have made all possible efforts to resolve their differences. The custom is attributed to the hadith—the record of the traditions and sayings of Prophet Muhammad, which is held in high regard by Muslims.

Indeed, in practice, some Muslim sects believe that a marriage can continue if the husband decides to reconcile within three months of him conveying talaq. A wife cannot obtain instant divorce. Instead, divorce initiated by a wife is called khula—and is obtained through arbitration in Muslim courts.

After the bill’s passage, Indian Prime Minister Narendra Modi tweeted: “Parliament abolishes Triple Talaq and corrects a historic wrong done to Muslim women.”

The clamor around instant divorce has been building for the past decade. In that time, there have been reported cases of Muslim men, such as Rehman’s husband, carrying out instant divorce through letters, text messages, emails, and WhatsApp messages—without providing alimony or financial support.

The Bharatiya Muslim Mahila Andolan (BMMA), a women’s-rights group, spearheaded the campaign for the ban. The BMMA raises awareness on the issue and provides legal aid to women who report misuse of divorce provisions.

Rehman was exploring options to make her husband accountable when she was introduced to BMMA members. She and others who were divorced in a similar manner filed a lawsuit that made its way to India’s Supreme Court. In 2017, the court declared instant divorce illegal and unconstitutional. In effect, the judgment meant that such divorce could not end a marriage.

[Read: India’s Supreme Court is teetering on the edge]

The Bharatiya Janata Party–led government’s stance is that it enacted the law this week to reinforce the court ruling. Law Minister Ravi Shankar Prasad told the upper house of Parliament that more than 300 cases have come to light since the court’s judgment. The government maintains that Muslim women are vulnerable both socially and financially because of an absence of reforms in the Muslim community. There is no official data on the prevalence of instant divorce in India.

But the passage of the law also raises questions about whether the government should involve itself in what is essentially Muslim personal law. At issue is the practice of religion in India. To account for a diverse population of different faiths, the framers of India’s constitution, which was adopted in 1950, allowed every religious group to formulate personal laws. So, a Hindu would be allowed to follow Hindu rules for marriage; ditto Christians and those of other faiths. (Couples also can—and do—choose to marry under the secular Special Marriage Act.) For Muslims, who constitute 14 percent of India’s 1.3 billion population, family matters, including marriage, divorce, and inheritance, come under the purview of Muslim personal law.

An analysis of Indian census data conducted by Abusaleh Shariff, an economist at the U.S.-India Policy Institute, based in Washington, D.C., and Syed Khalid, a research associate at the Centre for Research and Debates in Development Policy, showed that the number of separated and abandoned women in India, at 2.3 million, is twice the number of divorced women. If the government were serious about women’s rights, the researchers said, it would introduce reforms across communities, rather than focusing on one religious practice pertaining to Muslims.

The BMMA calls that argument irrational. Just “because there is no law against terrible spouses in other religions, a law specifically meant to punish Muslim men, when the complaint is initiated by the aggrieved wife or her family, [isn’t] discriminatory,” Mariya Salim, a researcher and BMMA member, told me. She said that rather than being a victory for the BJP, the bill’s passage is “the triumph of Muslim women fighting against the unconstitutional and non-Islamic practice.”

Opposition parties, as well as human-rights advocates, have condemned the practice of instant divorce, but they also accuse the BJP of demonizing Muslims. They say the ban feeds into the perceived marginalization of Muslims who feel threatened by recent attacks by Hindu vigilantes. Additionally, they say, Indian Muslims face more pressing issues: Various surveys have highlighted their poor economic and social conditions.

[Read: How Hinduism became a political weapon in India]

The All India Muslim Personal Law Board (AIMPLB), an NGO that supervises the implementation of Muslim personal law in the country, says the Indian government should abstain from matters of faith, citing the Indian constitution. The AIMPLB and some Islamic scholars in India say they believe that the legislation is a step toward replacing personal laws with a uniform civil code that would encompass all Indian citizens, irrespective of faith. This idea, which they oppose, is supported by the Rashtriya Swayamsevak Sangh, an influential Hindu nationalist group that is the BJP’s ideological parent.

Additionally, says Ziya Us Salam, a New Delhi–based journalist and the author of Till Talaq Do Us Part, “The Koran gives a squabbling couple two chances for reconciliation.”

“The bill takes away a chance at any reconciliation,” he told me. “Any man jailed because of the wife’s complaint will never opt for reconciliation. The bill leaves women penniless, children practically orphaned. If the man [is] imprisoned, how will he provide maintenance to his wife? The bill amounts to a state coercion.” (Under Islamic law, a woman is entitled to seek a subsistence allowance from her husband for herself and her dependent children.)

Salam and many Muslim groups in India question the need for legislation when the Supreme Court, in multiple hearings, has struck down instant divorce. “According to the court, the marriage is intact after triple talaq. Where is the crime?” he asked.

But for Rehman and other women who pushed for the change, the bill’s passage is historic. “We cannot change whatever happened to me,” she told the Indian Express newspaper. “But we now have a way to stop this practice which has been going on for centuries.”

Saturday, 3 August 2019

Alexandria Ocasio-Cortez’s Chief of Staff and Communications Director Will Depart Her Office

Alexandria Ocasio-Cortez’s Chief of Staff and Communications Director Will Depart Her Office

Two of Rep. Alexandria-Ocasio Cortez’s top staffers are leaving her office.

Saikat Chakrabarti, her chief of staff, and Corbin Trent, her director of communications — who, through their work with Justice Democrats, have been alongside Ocasio-Cortez since her primary run — will leave the lawmaker’s office. Chakrabarti will go to New Consensus, a nonprofit focused on climate issues and promoting the Green New Deal. Trent will direct communications on Ocasio-Cortez’s 2020 campaign, the same role he played during her first congressional run.

“Saikat has decided to leave the office of Rep. Ocasio-Cortez to work with New Consensus to further develop plans for a Green New Deal,” Trent said in a statement to The Intercept. “We are extraordinarily grateful for his service to advance a bold agenda and improve the lives of the people in NY-14. From his co-founding of Justice Democrats to his work on the Ocasio-Cortez campaign and in the official office, Saikat’s goal has always been to do whatever he can to help the larger progressive movement, and we look forward to continuing working with him to do just that.”

Chakrabarti wants to prioritize working on advancing the Green New Deal, something he can focus on more at New Consensus than he can while managing Ocasio-Cortez’s office and deflecting attacks from House leadership. He also has a new baby, and will have more time to devote to parenting.

Ocasio-Cortez asked Trent to move to the campaign, she told The Intercept. Trent is “shifting to our campaign side so we can work on some ambitious comms projects we’ve been looking forward to working on,” Ocasio-Cortez said in a text message. Ocasio-Cortez is facing one Republican opponent, Scherie Murray, a businesswoman from New York who immigrated to the U.S. from Jamaica as a child.

Chakrabarti’s last day is Friday, August 2, and Trent’s transition timeline is still unclear, Ocasio-Cortez told The Intercept. Trent told The Intercept he expects to continue serving as spokesperson through the end of August. Trent, who has been directing communications for the Ocasio-Cortez campaign part time since 2018, will now do so full time. Ariel Eckblad, Ocasio-Cortez’s legislative director, will take over as chief of staff.

The news comes just as a drawn-out fight between House Democratic leadership and the progressive wing of the party — which at times put Ocasio-Cortez’s staffers in its crosshairs — seemed to be smoothing over. Progressives in the House have tangled with leadership over a series of policy fights including emergency funding at the border and how to hash out the approach to Medicare for All and a Green New Deal. They’ve also clashed over the growing number of candidates challenging Democratic incumbents, as Ocasio-Cortez did last year — moves that have been met with backlash from the House’s campaign arm.

The fight bled into a broader discourse over when and how it’s most appropriate to air disputes between colleagues, with House Speaker Nancy Pelosi disparaging members of the progressive “Squad” in a July interview with the New York Times. Pelosi took a swipe at Ocasio-Cortez, along with Reps. Ilhan Omar, Rashida Tlaib, and Ayanna Pressley, who broke with Democrats and voted against a border funding bill in late June, calling them “four people” with a “public whatever and their Twitter world” who don’t have “any following.”

In a closed-door meeting a few days after the Times interview, Pelosi told colleagues, “do not tweet” about other members, a warning viewed as being directed at the Squad and Ocasio-Cortez’s staff. Ocasio-Cortez told the Washington Post she thought Pelosi’s comments were “outright disrespectful,” and singled out the four women of color in a way that was unfair.

According to Ocasio-Cortez’s office, the departures are not a result of the dust-up with leadership, and were decided well before the public feuds took place. The idea from the start was to have Ocasio-Cortez’s office continue to build out a movement beyond the walls of Congress, a member of her staff told The Intercept. They had never really planned to build a career on the Hill, and always had their sights on returning to on-the-ground activism after they got things rolling. With the momentum building around her signature proposal for a Green New Deal, and Congress entering recess, the staffer said, it made sense to formalize the transitions, which had been in the works for some time, now.

The departures are not a result of the dust-up with leadership, and were decided well before the public feuds took place.

“With the Ocasio2020 campaign beginning to ramp up, I’ve asked Corbin to transition to the campaign full-time and he has agreed to do so,” Ocasio-Cortez told The Intercept. “I’m looking forward to growing the movement with him in Queens and the Bronx and across the country.

Saikat has decided to leave the office to work with New Consensus to further develop plans for a Green New Deal. I am extraordinarily grateful for his service to advance a bold agenda and improve the lives of the people in NY-14. From his co-founding of Justice Democrats to his work on the campaign and in the official office, Saikat’s goal has always been to do whatever he can to help the larger progressive movement, and I look forward to continuing working with him to do just that.”

Chakrabarti, who helped to manage Ocasio-Cortez’s 2018 campaign, has been a target of Ocasio-Cortez’s critics on Capitol Hill.

The tensions bubbled up earlier this summer, when Chakrabarti compared moderate Democrats who sabotaged a version of the border bill package supported by the Squad to “new Southern Democrats,” in a June tweet that has since been deleted.


In mid-July, House Democrats, in their official Twitter account, which is run by the office of Rep. Hakeem Jeffries, D-N.Y., singled out Chakrabarti for an attack, referencing tweets he made during that June dispute.

screenshot-1564780462

A tweet from the House Democrats’ official Twitter account, which has since been deleted.

Screenshot: The Intercept

The tweet, which was sent on a Friday night, has since been deleted. At the time, Chakrabarti said his comments were taken out of context, and emphasized that the focus shouldn’t be on intrademocratic fighting: “Our Democracy is literally falling apart. I’m not interested in substance-less Twitter spats,” he added.

Trent has kept a relatively low profile while serving in his current role. He said he sees other opportunities to make an impact outside of Congress.

“There’s as much ground to be gained working as an activist as there is as a staffer,” Trent told The Intercept about his transition to Ocasio-Cortez’s 2020 campaign. “Activism and legislating with a third of government are not the same thing.”

Update, August 2, 2019, 5:39 p.m. ET
This piece has been updated to include a screenshot of the House Democrats tweet, as well as added details about the transitions in Ocasio-Cortez’s office.

The post Alexandria Ocasio-Cortez’s Chief of Staff and Communications Director Will Depart Her Office appeared first on The Intercept.

Thursday, 1 August 2019

Deltan Dallagnol incentivou cerco da Lava Jato ao ministro do STF Dias Toffoli

Deltan Dallagnol incentivou cerco da Lava Jato ao ministro do STF Dias Toffoli

O procurador Deltan Dallagnol incentivou colegas em Brasília e Curitiba a investigar o ministro Dias Toffoli sigilosamente em 2016, numa época em que o atual presidente do Supremo Tribunal Federal começava a ser visto pela operação Lava Jato como um adversário disposto a frear seu avanço.

Mensagens obtidas pelo Intercept e analisadas em conjunto com a Folha revelam que Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, buscou informações sobre as finanças pessoais de Toffoli e sua mulher e evidências que os ligassem a empreiteiras envolvidas com a corrupção na Petrobras.

Ministros do STF não podem ser investigados por procuradores da primeira instância, como Dallagnol e os demais integrantes da força-tarefa. A Constituição diz que eles só podem ser julgados pelo próprio tribunal, onde quem atua em nome do Ministério Público Federal é o procurador-geral da República.

As mensagens examinadas pela Folha e pelo Intercept mostram que Dallagnol desprezou esses limites ao estimular uma ofensiva contra Toffoli e sugerem que ele também recorreu à Receita Federal para levantar informações sobre o escritório de advocacia da mulher do ministro, Roberta Rangel.

A movimentação de Dallagnol, no entanto, não tem relação com o episódio em que Toffoli foi identificado pelo empresário Marcelo Odebrecht como o “amigo do amigo do meu pai” citado num e-mail enviado a executivos da empreiteira em 2007. Colaborador da Lava Jato, Marcelo fez a ligação ao responder questionamentos da Polícia Federal. O caso veio à tona quando seu ofício à PF foi revelado pela revista Crusoé, em reportagem publicada em abril deste ano, censurada pelo STF e republicada pelo Intercept.

Dias Toffoli.

Toffoli tornou-se ministro do STF em 2009, por indicação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Antes, chegou a trabalhar como advogado do PT e assessorou juridicamente a Casa Civil quando José Dirceu era ministro.

Foto: Sergio Lima/AFP/Getty Images

O chefe da força-tarefa começou a manifestar interesse por Toffoli em julho de 2016, quando a empreiteira OAS negociava um acordo para colaborar com as investigações da Lava Jato em troca de benefícios penais para seus executivos.

No dia 13 de julho, Dallagnol fez uma consulta aos procuradores que negociavam com a empresa. “Caros, a OAS trouxe a questão do apto do Toffoli?”, perguntou no grupo Acordo OAS, no Telegram. “Que eu saiba não”, respondeu o promotor Sérgio Bruno Cabral Fernandes, de Brasília. “Temos que ver como abordar esse assunto. Com cautela.”


13 de julho de 2016 – Grupo Acordo OAS

Deltan Dallagnol – 22:36:58 – Caros, a OAS trouxe a questão do apto do Toffoli?
Sérgio Bruno Cabral Fernandes. – 22:55:26 – Que eu saiba não. Temos que ver como abordar esse assunto. Com cautela.
Dallagnol – 23:09:42 – Quando é a próxima reunião?


 

Em 27 de julho, duas semanas depois, Dallagnol procurou Eduardo Pelella, chefe do gabinete do então procurador-geral Rodrigo Janot, para repassar informações que apontavam Toffoli como sócio de um primo num resort no interior do Paraná. Dallagnol não indicou a fonte da dica.

No dia seguinte, o chefe da força-tarefa insistiu com o assessor de Janot. “Queria refletir em dados de inteligência para eventualmente alimentar Vcs”, escreveu. “Sei que o competente é o PGR rs, mas talvez possa contribuir com Vcs com alguma informação, acessando umas fontes.”

Dallagnol continuava interessado no caso do ministro do Supremo. “Vc conseguiria por favor descobrir o endereço do apto do Toffoli que foi reformado?”, perguntou. “Foi casa”, respondeu Pelella. Ele evitou esticar a conversa na hora, mas informou o endereço a Dallagnol dias depois.


28 de julho de 2016 – Chat privado

Dallagnol – 22:09:59 – Pelella, queria refletir em dados de inteligência para eventualmente alimentar Vcs. Sei que o competente é o PGR rs, mas talvez possa contribuir com Vcs com alguma informação, acessando umas fontes. Vc conseguiria por favor descobrir o endereço do apto do Toffoli que foi reformado?
Pellela – 23:16:05 – Foi casa
Pellela – 23:16:09 – Consigo sim
Pellela – 23:16:15 – Amanhã de manhã
Dallagnol – 23:21:39 – ótimo, obrigado!


 

Dallagnol não foi atendido. Mas o procurador insistiu:


4 de agosto de 2016 – Chat privado

Dallagnol – 20:05:09 – Pelella consegue ainda o endereço do Toffoli?
Pellela – 20:30:31 – Sim
Pellela – 20:30:34 – Perai
Pellela – 20:49:55 – SUPRIMIDO
Dallagnol – 21:01:34 – Valeu!!


 

Todas as mensagens foram reproduzidas com a grafia encontrada nos arquivos originais obtidos pelo Intercept, incluindo erros de português e abreviaturas. As revelações, que publicamos em parceria com o jornal Folha de S.Paulo, estão em um arquivo de documentos fornecidos exclusivamente ao Intercept por uma fonte anônima (leia nossa declaração editorial aqui) e fazem parte da série Vaza Jato.

Signature of a law that deals with aspects related to women and

Em julho de 2016, Dallagnol consultou os colegas que negociavam um acordo com a OAS para saber se tinham informações sobre Toffoli, visto como um inimigo da Lava Jato.

Foto: Mateus Bonomi/AGIF(via AP)

Em suas primeiras reuniões com os procuradores da Lava Jato, os advogados da OAS contaram que a empreiteira havia participado de uma reforma na casa de Toffoli em Brasília. Os serviços tinham sido executados por outra empresa indicada pela construtora ao ministro, e ele fora o responsável pelo pagamento.

O ex-presidente da OAS Léo Pinheiro, que disse ter tratado do assunto com Toffoli e era réu em vários processos da Lava Jato, afirmou a seus advogados que não havia nada de errado na reforma, mas o caso despertou a curiosidade dos procuradores mesmo assim.

Duas decisões de Toffoli no STF tinham contrariado interesses da força-tarefa nos meses anteriores. Ele votara para manter longe de Curitiba as investigações sobre corrupção na Eletronuclear e soltara o ex-ministro petista Paulo Bernardo, poucos dias após sua prisão pelo braço da Lava Jato em São Paulo.

Os procuradores Carlos Fernando dos Santos Lima e Diogo Castor de Mattos, da força-tarefa de Curitiba, chegaram a criticar Toffoli num artigo publicado pela Folha no início de julho daquele ano. Eles compararam a soltura de Bernardo a um duplo twist carpado, por causa da “ginástica jurídica” usada para justificar a decisão.

As mensagens obtidas pelo Intercept não permitem esclarecer se alguma investigação formal sobre o ministro do STF foi aberta, mas mostram que Dallagnol continuou insistindo no assunto mesmo depois que um vazamento obrigou os procuradores a recuar.

‘Qdo chega no judiciário, eles se fecham’

Em agosto de 2016, a revista Veja publicou uma reportagem de capa sobre a reforma na casa de Toffoli, apontando a delação de Léo Pinheiro como fonte das informações. Embora os advogados da OAS tivessem mencionado o caso aos procuradores, eles ainda não tinham apresentado nenhum relato por escrito sobre o assunto.

O vazamento causou mal-estar no Supremo e levou a Procuradoria-Geral da República a suspender as negociações com a OAS, para evitar uma crise que poderia prejudicar o andamento de outras investigações.

O rompimento dividiu a força-tarefa de Curitiba, segundo as mensagens do chat FT MPF Curitiba 3 analisadas pela Folha e pelo Intercept. Carlos Fernando defendeu a medida, mas Dallagnol achava que o recuo seria interpretado como uma tentativa de proteger Toffoli e o STF, impedindo a apuração de desvios.

“Qdo chega no judiciário, eles se fecham”, disse o procurador aos colegas em 21 de agosto, um dia após a reportagem sobre Toffoli chegar às bancas. “Corrupção para apurar é a dos outros.”

Carlos Fernando temia que os ministros do Supremo reagissem impondo obstáculos para novos acordos de colaboração e criando outras dificuldades para a Lava Jato.

“Só devemos agir em relação ao STF com provas robustas”, afirmou. “O que está em jogo aqui é o próprio instituto da colaboração. Quanto a OAS e ao toffoli, as coisas vão crescer e talvez daí surjam provas.”

No mesmo dia, horas mais tarde, o procurador Orlando Martello sugeriu que os colegas pedissem à Secretaria de Pesquisa e Análise (SPEA) da Procuradoria-Geral da República um levantamento sobre pagamentos da OAS ao escritório da mulher de Toffoli.

“A respeito do Toffoli, peçam pesquisa para a Spea de pagamentos da OAS para o escritório da esposa do rapaz q terão mais alguns assuntos para a veja”, disse Orlando no Telegram. “Não é nada relevante, mas acho q da uns 500 mil”.

Em resposta ao colega, Dallagnol afirmou que a Receita Federal já estava pesquisando o assunto, mas disse que não sabia dos pagamentos que teriam sido feitos pela OAS. “A RF tá olhando”, escreveu o chefe da força-tarefa. “Mas isso eu não sabia.”

“Quem aposta que Toffoli cai até o fim da LJ?”, escreveu Dallagnol aos colegas do grupo Filhos do Januario 1 em novembro de 2016.

Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

Dias após a publicação da reportagem sobre a delação da OAS, o ministro Gilmar Mendes saiu em defesa de Toffoli e do STF e apontou os procuradores da Lava Jato como responsáveis pelo vazamento, acusando-os de abuso de autoridade.

Dallagnol propôs aos colegas a divulgação de uma nota em resposta ao ataque do ministro, mas não conseguiu apoio suficiente para a iniciativa. “Não acho que seja uma boa estratégia”, disse Pelella em um chat privado com Dallagnol. “Isso tende a acirrar os ânimos no STF.”

Pouco depois, Dallagnol escreveu a Orlando Martello em busca de novidades sobre a mulher de Toffoli. As pesquisas não pareciam ter avançado, e o chefe da força-tarefa sugeriu que o colega também procurasse informações sobre a mulher de Gilmar, Guiomar Mendes.

“Tem uma conversa de que haveria recebimentos cruzados pelas esposas do Toffoli e Gilmar”, escreveu Dallagnol. “Tem mta especulação. Temos a prova disso na nossa base? Vc teve contato com isso?”

Martello disse que não tinha nada que confirmasse as suspeitas, mas compartilhou com Dallagnol informações que recebera um ano antes sobre a atuação do escritório da mulher de Toffoli na defesa de outra empreiteira, a Queiroz Galvão, no Tribunal de Contas da União.

O informante de Martello, que ele não identificou na conversa com Dallagnol, dizia ter encontrado uma procuração que nomeava Toffoli e a mulher como representantes da empresa no TCU e sugeria que essa ligação obrigava o ministro a se afastar dos processos da Lava Jato.


26 de agosto de 2016 – Chat particular

Orlando Martello – 09:10:04 – Esposa do Toffoli; não do gilmar. Sim, prestação de serviços do escritório de advocacia dela para, acho, OAS. Só estou em dúvida se foi para a OAS ou outra empreiteira, mas quase certeza de que foi para a oas. Fatos de 2009 ou 2010. Não me recordo bem. Jonathas pode fazer esta pesquisa.
Deltan Dallagnol – 10:02:15 – Tem uma conversa de que haveria recebimentos cruzados pelas esposas do Toffoli e Gilmar. Tem mta especulação. Temos a prova disso na nossa base? Vc teve contato com isso?
Dallagnol – 10:02:25 – Aí é diferente rs
Martello – 12:20:46 – Não. Não tenho nada sobre isso.
Martello – 12:21:23 – achei o que me mandaram.
Martello – 12:21:30 – Achei uma procuração do toffoli e da mulher dele, representando Queiroz Galvão no tcu… Então eles podem ter recebido pagamentos em 2009, ano que tem quebra fiscal por aí. Nós vamos tratar isso com toda a gravidade que merece. ele tinha que ter se declarado impedido… Não pode ajudar só a achar esses pagamentos?? Com certeza tem algum pagamento em 2009 pela Queiroz Possíveis favorecidos: TOFFOLI E TELESCA ADVOGADOS ASSOCIADOS S C CNPJ SUPRIMIDO TOFFOLI RAVANELLI E MASSULA ADVOGADOS ASSOCIADOS ME CNPJ SUPRIMIDO JOSE ANTONIO DIAS TOFFOLI CPF SUPRIMIDO ROBERTA MARIA RANGEL CPF SUPRIMIDO RANGEL ADVOCACIA CNPJ SUPRIMIDO
Martello – 12:22:10 – É sobre a queiroz galvão e não sobre a oas
Dallagnol – 13:53:13 –
Martello – 14:50:43 – Mas olha que não pedi pesquisa em relação a OAS!!!


 

Toffoli e a mulher foram sócios do mesmo escritório de advocacia até 2007, quando ele saiu para assumir a chefia da Advocacia-Geral da União. Duas semanas depois do diálogo de Dallagnol com Martello, a Folha publicou reportagem sobre pagamentos que um consórcio liderado pela Queiroz Galvão fez ao escritório em 2008 e 2011, no valor total de R$ 300 mil.

As mulheres de Toffoli e Gilmar foram mesmo alvo da Receita. Em fevereiro deste ano, o jornal O Estado de S. Paulo informou que elas fizeram parte de um grupo de 134 contribuintes investigados por uma equipe especial criada pelo fisco em 2017.

Em 14 de novembro de 2016, Dallagnol ainda fez uma brincadeira com a possibilidade de o ministro ser enquadrado pela operação. “Quem aposta que Toffoli cai até o fim da LJ? Por enquanto a aposta de que cai para mais, mas a coisa pode se inverter kkkk”, escreveu aos colegas do grupo Filhos do Januario 1.

Signature of a law that deals with aspects related to women and

Dallagnol manobrou para barrar a indicação do ministro Humberto Martins, do STJ, para uma vaga que estava aberta no Supremo.

Foto: Raquel Cunha/Folhapress

Toffoli não foi o único alvo da Lava Jato na cúpula do Judiciário. As mensagens obtidas pelo Intercept mostram que Dallagnol também usou a delação da OAS para tentar barrar a indicação de um ministro do Superior Tribunal de Justiça, Humberto Martins, para a vaga aberta no STF com a morte de Teori Zavascki em 2017.

Os procuradores voltaram à mesa de negociações com os advogados da OAS em março de 2017, quando Léo Pinheiro estava preso em Curitiba e se preparava para depor no processo em que incriminou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva por causa do tríplex de Guarujá.

O acordo com o empreiteiro foi assinado no fim do ano passado, mas até hoje não foi encaminhado pela procuradora-geral Raquel Dodge ao Supremo para homologação. Sem isso, Pinheiro não pode sair da cadeia e receber os benefícios acertados com a Lava Jato, e as informações que ele forneceu às autoridades não podem ser usadas.

‘É importante o PGR levar ao Temer a questão do Humberto Martins’

Mesmo assim, quando o nome de Humberto Martins apareceu na imprensa como um dos cotados para a vaga no Supremo, Dallagnol procurou Pelella para sugerir que Janot alertasse o então presidente Michel Temer de que ele era um dos alvos da delação de Léo Pinheiro.

“É importante o PGR levar ao Temer a questão do Humberto Martins, que é mencinoado na OAS como recebendo propina…”, disse Dallagnol ao colega. “Deixa com ‘nós'”, respondeu Pelella.

O chefe da força-tarefa de Curitiba sugeriu que o assessor de Janot conferisse os documentos anexados pela OAS à sua proposta de colaboração, mas depois se lembrou de que a Lava Jato não recebera até então nenhum relato escrito sobre Martins.

Mesmo assim, Dallagnol insistiu com Pelella para que avisasse o presidente. “Não tá nos anexos, mas iriam entregar. Só não lembramos se era corrupção ou filho… vou ver se alguém lembra e qq coisa aviso, mas já cabe a ponderação pq seria incompativel”, afirmou no Telegram.

Fazia cinco meses que as negociações com a OAS tinham sido encerradas. Como o acordo com a empreiteira não fora assinado nem homologado, as informações fornecidas por Léo Pinheiro durantes as negociações não podiam ser usadas pelos investigadores.

O anexo com o relato sobre Martins só surgiu após a retomada das negociações em março de 2017. Segundo Léo Pinheiro, a OAS pagou R$ 1 milhão a um filho do ministro em 2013 para obter uma decisão favorável no STJ. Em janeiro, Martins disse à Folha que nunca atendeu pedidos da OAS e sempre se declarou impedido de julgar ações em que o filho atue.

Questionados sobre as mensagens, a força-tarefa à frente da Operação Lava Jato em Curitiba afirmou que é seu dever encaminhar à Procuradoria-Geral da República informações sobre autoridades com direito a foro especial no Supremo Tribunal Federal sempre que as recebe, e que isso tem sido feito de forma legal. A força-tarefa, no entanto, não fez comentários específicos sobre o conteúdo das conversas.

“É comum o intercâmbio de informações para verificar, em caráter preliminar, supostos fatos de que o Ministério Público tenha conhecimento”, afirmou a força-tarefa, por meio de nota. “Isso impede inclusive que se dê iní­cio a apurações injustificadas.”

A força-tarefa tampouco respondeu como Dallagnol soube da participação da OAS na reforma da casa de Toffoli e como soube que a Receita Federal estava analisando as finanças do escritório de sua mulher, Roberta Rangel. O procurador preferiu não se manifestar.

O chefe da força-tarefa também não quis esclarecer por que usou informações da delação do empreiteiro Léo Pinheiro para tentar impedir a nomeação do ministro Humberto Martins para uma vaga no STF, como revelam as mensagens obtidas pelo Intercept.

O procurador Eduardo Pelella, que trocou informações sobre Toffoli com Dallagnol, não quis fazer comentários. Informado sobre o conteúdo das mensagens e seu contexto, disse que não tem como verificar sua autenticidade “para que se possam identificar falsas imputações”.
Os ministros Dias Toffoli e Gilmar Mendes também não quiseram se manifestar, assim como a Procuradoria-Geral da República.

O ministro Humberto Martins, do Superior Tribunal de Justiça, afirmou estranhar sua citação pela delação de Léo Pinheiro e disse que, na maioria dos casos, sempre decidiu contrariamente aos interesses da OAS e de seu ex-presidente.

The post Deltan Dallagnol incentivou cerco da Lava Jato ao ministro do STF Dias Toffoli appeared first on The Intercept.